Retranca: Patente MackGraphe

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A busca do óxido de grafeno perfeito

Trabalho de pesquisadores do MackGraphe pode render patente; material descoberto é superior ao comercializado mundialmente e tem ampla aplicação industrial.

Fotos: NTAI/Mackenzie

Resistência, preservação de propriedades e tamanho adequado. Há muitos anos, os pesquisadores do Instituto Mackenzie de Pesquisas em Grafeno e Nanotecnologias, o MackGraphe, sabem quais as características do óxido de grafeno perfeito — não confunda esse material com grafeno, simplesmente. A professora Camila Maroneze chegou à equipe do MackGraphe no início de 2016 e logo juntou-se ao time que se dedicava a estudar a síntese do óxido de grafeno. O objetivo da empreitada era dominar o processo de obtenção do material, possibilitando que o MackGraphe fosse a fonte dos próprios insumos. As folhas de óxido de grafeno resultantes do processo seriam utilizadas na pesquisa aplicada, na qual a universidade desenvolve produtos e soluções práticas.

Camila Maroneze, pesquisadora do MackGraphe

O aprendizado teve êxito e, por volta de 2019, após anos de testes, o MackGraphe já dominava a síntese do óxido de grafeno. E foi despretenciosamente que Camila descobriu que o material que tinha em mãos era diferenciado. “O óxido de grafeno é o insumo básico do dia a dia das pesquisas; por isso, queríamos que fosse o melhor possível”, explica a professora. “Mas percebemos que nosso material tinha características que permitiam melhor desempenho nas atividades. Decidimos compará-lo com materiais adquiridos fora do Brasil, e esses testes mostraram que tínhamos algo muito valioso em mãos, que merecia uma patente”, resume.

E foi assim que, em 2023, ela e Matheus Dias, seu orientando no Mestrado em Engenharia de Materiais e Nanotecnologia da Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM), depositaram o pedido de patente do método de síntese desenvolvido no MackGraphe. Agora, cabe ao Instituto Nacional da Propriedade Intelectual (Inpi) analisar o pedido de registro de patente enviado pelo Mackenzie. De posse da propriedade intelectual, o MackGraphe poderá licenciar o processo produtivo para indústrias interessadas.

Receita diferente

Sintetizar óxido de grafeno é mais ou menos como fazer uma receita culinária tradicional. Os ingredientes são os mesmos, e o passo a passo também segue uma ordem preestabelecida. Para chegar ao “prato” chamado óxido de grafeno, os cientistas precisam usar ingredientes oxidantes e, ao final do processo, retirá-los do produto final. Esse trabalho é delicado, e o cuidado nas etapas é responsável pela obtenção de um material mais ou menos íntegro, puro e resistente. “É um processo com etapas drásticas do ponto de vista experimental. É preciso colocar muita energia, e isso acaba fragmentando as folhas de óxido de grafeno durante o protocolo experimental”, explica Camila. “Dependendo de como você processa o material, acaba fazendo com que ele se quebre muito desde o momento da síntese até a etapa final de purificação, quando retiramos os resíduos”, completa.

O objetivo da pesquisa básica do MackGraphe era otimizar esse processo, evitando etapas que, embora sejam utilizadas no mundo todo, são reconhecidas por provocar algum dano às folhas. O material buscado deveria ter como característica o maior tamanho lateral possível e a menor espessura, que é uma única camada. Ao longo dos anos, dos testes e das modificações feitas no processo, a equipe chegou a uma “receita” um pouco diferente, que gera um produto final melhor. “O diferencial dessa patente é que conseguimos desenvolver uma rota experimental em que ao final do processo temos um material que na média tem um tamanho lateral das camadas muito superior ao que encontramos comercialmente”, diz a professora.

O passo a passo desenvolvido pelo MackGraphe é, naturalmente, um segredo industrial. Mas a professora Camila faz uma analogia que ajuda a explicar o que a rota desenvolvida por ela tem de diferente: “É como se estivéssemos preparando um prato. Há alguns caminhos para chegar no resultado usando os mesmos ingredientes, mas com ajustes experimentais diferentes. E o tempero final muda bastante se a gente faz isso”. Com os mesmos reagentes e técnicas, o MackGraphe chegou a um material mais preservado estruturalmente. A técnica leva mais tempo do que o utilizado comumente, mas rende um material com melhores características estruturais para aplicações industriais específicas.

Aplicação industrial

“O fato de termos camadas maiores e mais finas implica que, de modo geral, possamos usar muito menos material. E você preserva mais as propriedades interessantes do grafeno, como a alta resistência mecânica”, aponta Camila.

Esse tipo de óxido de grafeno tem ampla aplicação industrial. Na fabricação de dispositivos para o tratamento de água, as folhas entram na composição de membranas que fazem a filtração. Na fabricação de nanocompósitos poliméricos, o material pode agregar resistência mecânica. Na área de energia, o óxido de grafeno vem sendo utilizado para fabricar baterias e capacitores que prezam pelo alto desempenho e pela leveza.

O material desenvolvido pelo Mackenzie passou por todas as etapas de testes, inclusive na aplicação prática. “Repetimos muitas vezes para ter certeza de que era um processo reprodutível. Esse material foi testado em aplicações diferentes e usado como base para alguns projetos desenvolvidos pelo MackGraphe em parceria com empresas”, revela a professora. E não deu outra: comparado com a performance do óxido de grafeno comprado de duas empresas europeias, o material aqui desenvolvido saiu-se melhor. “Ele foi muito testado e explorado até o momento em que foi possível escrever a patente para proteger a tecnologia. Tivemos um trabalho experimental enorme”, relembra.

“Esse processo de síntese de óxido de grafeno, além de inovador, é estratégico para o MackGraphe à medida que, por meio da proteção da respectiva Propriedade Intelectual, vai possibilitar a transferência de tecnologia de um insumo fundamental para o desenvolvimento de projetos de nanotecnologias nos vários segmentos de mercado nos quais atuamos”, ressaltou dr. Benedito Aguiar, diretor-geral do MackGraphe.

Diversidade e inovação

O documento de depósito da patente também conta com outras comparações. Em uma delas, a equipe utilizou como base um estudo internacional que comparou cerca de quarenta amostras de óxido de grafeno em matéria de grau de esfoliação e tamanho lateral das camadas. “Também fizemos uma comparação com patentes depositadas no Brasil e nos Estados Unidos, comparando nosso material com o que essas empresas patentearam”, diz a professora.

A qualidade do trabalho não veio por acaso. Além do tempo dedicado à busca pelo melhor material, o fato de o MackGraphe ser um centro de pesquisas interdisciplinar agregou qualidade ao projeto. Camila, por exemplo, é graduada e doutora em Química. Matheus, seu orientando, é oriundo da graduação em Engenharia Mecânica. E muitos outros pesquisadores, da Iniciação Científica ao Pós-Doutorado, conviveram no ambiente de pesquisa no qual o processo foi consolidado e registrado por Maroneze e Dias.

“É um ambiente onde todos cooperam, e essa patente é a prova de que um ambiente integrado, com viés aplicado na pesquisa básica, torna possíveis coisas incríveis”, comemora Camila. O projeto de inovação na síntese do óxido de grafeno não teria sido possível sem a bagagem da pesquisa fundamental, mas foi a sobreposição de atuações distintas que tornou o processo mais produtivo. No MackGraphe, atuam lado a lado químicos, engenheiros, físicos e cientistas de muitos outros backgrounds acadêmicos.

A parceria com o universo produtivo é outro ingrediente dessa receita. “É muito fértil juntar a pesquisa fundamental com as necessidades das empresas e colocar isso no mesmo plano. Juntar conhecimento com solução de problemas. Nossa intenção não era criar uma patente, mas o ambiente do MackGraphe permitiu que esse desenvolvimento acontecesse”, atesta a professora.

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