Na manhã do dia 04 de agosto, a Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM), por meio da Pró-Reitoria de Graduação (PRGA), realizou o Painel Internacional “Aprendizagem transformadora no ensino superior: enfrentando os dilemas do nosso tempo e buscando um novo futuro”, que teve como principal intuito expor aos docentes mackenzistas o conceito deste tipo de aprendizagem, que se preocupa com a transformação de indivíduos, de relações e de sistemas. O painel é parte do I Fórum de Aprendizagem Transformadora e Planejamento Pedagógico.
O debate contou com a participação dos professores Jeff King, um dos fundadores do sistema Student Transformative Learning Record (STLR - Registro de Aprendizagem Transformadora do Aluno), da University of Central Oklahoma, dos Estados Unidos; Peter Taylor, da Murdoch University, da Austrália, defensor da diversidade biocultural e orientador de pós-graduação de muitos educadores em diversos continentes; Nalini Chitanand, coordenadora de Desenvolvimento de Pessoal no Centro de Excelência em Ensino e Aprendizagem (CELT) da Durban University of Technology, da África do Sul; e Paul Dervan e Sandra Thompson, da Technological University Dublin, da Irlanda, e principais arquitetos e co-líderes da iniciativa STLR.
A abertura do webinar foi feita pela pró-reitora de Graduação da UPM, Janette Brunstein, que agradeceu a presença do reitor da Universidade, professor Marco Tullio de Castro Vasconcelos; do chanceler do Mackenzie, reverendo Robinson Grangeiro Monteiro; e dos demais pró-reitores, diretores e autoridades.
“Aprendizagem transformadora não é só transformar a si mesmo, mas sim o mundo ao redor”, disse a pró-reitora.
Jeff King explicou aos docentes mackenzistas que os alunos precisam mais do que apenas o conteúdo. O professor dos EUA exemplificou a aprendizagem transformadora em três tópicos: Dilema Desorientador; Autorreflexão Crítica e Perspectiva Alterada/Expandida.
Dentro dos desafios, King citou a pandemia do novo coronavírus, um problema que teve de ser enfrentado pelo mundo inteiro. “As pessoas estão trabalhando para mudar. A aprendizagem transformadora é desencadeada quando se depara com um dilema, o coronavírus é um deles”, pontua.
Questionado sobre qual é a importância de acompanhar o progresso da transformação dos alunos no período na universidade, o especialista explica que os professores são capazes de ajudar a desenvolver esse processo tão importante de como crescer como ser humano, além da oportunidade de motivar e contribuir para o bem social, imediatamente após a graduação. "Tudo isso pode acontecer em paralelo ao ensino do conteúdo”, adiciona.
E não é só o meio acadêmico que está interessado no tema, os empregadores também, afinal, “eles estão à procura de profissionais que saibam liderar, trabalhar em equipe, com pessoas diferentes e que possam discordar”, completa King.
Ampliação do olhar
Para Taylor, a aprendizagem transformadora trabalha com o mundo externo e faz muito mais pelo alunos. “Dá poder a eles, de uma forma mais profunda”, destaca. A partir do pensamento crítico, os discentes acessam seus sentimentos e emoções. “Temos um relacionamento mais emocional com o mundo exterior, isso traz outros valores ao jogo, a maneira como valorizamos a natureza, o relacionamento. Não se trata de um olhar inocente para o mundo e para o ser humano. Estamos interessados em mostrar aos alunos como o mundo pode ser um lugar melhor”, defende.
Esse ensino oferece a oportunidade de um autoconhecimento cultural, ficarmos mais cientes de nossos sistemas e de nossas vidas, pontua Taylor.
“Historicamente e contemporaneamente, trata-se de refletir sobre nós mesmos e compreender melhor nosso papel no mundo”, afirma o docente da Murdoch.
Com a aprendizagem transformadora, o foco é na compreensão de como uma cultura é diferente da outra e também agrega pensamento crítico ao mundo natural, “traz informação sobre como é o mundo normalmente e o que nos impede de colocar em prática o desenvolvimento sustentável e suas práticas”, completa Taylor.
No mundo todo, a educação superior se encontra em constante mudança. O processo de aprendizagem e de questionamento é contínuo. “Reaprender e, às vezes, desaprender a maneira de fazer as coisas, leva a um sistema de educação superior reformulado”, pontua a professora Nalini.
Além de trabalhar junto ao ensino objetivo tradicional, em prática em diversas instituições, é imprescindível fazer uma autorreflexão para entender como podemos contribuir para diminuir os problemas que nos cercam e trazer valores éticos. “Isso que é o ensino prático. Não significa só pensar em um mundo melhor, mas trazer a diferença, a aprendizagem para o ensino e ajudar os alunos”, pontua Taylor.
Autocrítica gera mudança
Para Nalini, transformação é um termo amplo e diferente em cada universidade. Em sua apresentação, ela expôs as manifestações que aconteceram de 2015 a 2017, na África do Sul, em que os estudantes reivindicavam uma educação superior descolonizada e gratuita para toda a população. “Tivemos de parar e repensar o que estávamos fazendo na educação superior”, afirma.
A pedagoga explica que começaram a analisar qual era o propósito da educação superior em seu país e como ela tinha sido moldada a partir do colonialismo. “Mesmo após 26 anos de democracia, ainda há racismo, considerando os materiais que nossos alunos não podem trabalhar, a presença do passado no nosso presente. Era necessário pararmos para analisar como a educação superior poderia ser mais justa e igualitária. Nós, professores, tivemos que rever nossos valores, crenças e premissas sobre as quais estávamos trabalhando”, pontua.
"Na África do Sul, atualmente, somos criados para sair do colonialismo, e pensar como a educação superior pode ser descolonizada", conta Nalini.
Ainda segundo a professora, quando fazemos um mergulho dentro de nós mesmos, conseguimos também enxergar a universidade como um todo. “Tornamos o que era invisível, mais visível. É isso que a aprendizagem transformadora faz: traz para a superfície aquilo que não víamos", completa.
Ela ainda ressalta que quando fala “nós”, ela está se referindo aos professores de educação superior, do seu país e do mundo. “O que estamos fazendo de transformação ou estamos mantendo o status quo?”, questiona.
Questionado sobre como a diversidade biocultural, em uma perspectiva da aprendizagem transformadora, pode contribuir para o enfrentamento de casos racistas, xenofóbicos e violência nas redes sociais, Taylor explica que as vozes que se erguem, como em Black Lives Matter, são vozes históricas, que estão voltando e trazendo reflexões, sobre segregação, desemprego e, inclusive, a pandemia.
“Como um homem branco e privilegiado, como posso estar ciente das questões sociais e que estão acontecendo? Como posso gerenciar essas questões nesse mundo ocidental? A aprendizagem transformadora direciona o aluno a questionar as suas premissas, suas crenças e questões culturais, e nós podemos fazer isso do ponto de vista da educação, nós podemos envolver os alunos em questão para compreender os valores, como as identidades culturais são construídas, para que se possa trazer discussão crítica sobre esse mundo natural que vivemos”, afirma Taylor.
Transformação do aluno
Sandra e Paul são os principais arquitetos e co-líderes da iniciativa Student Transformative Learning Record (STLR), traduzido como Registro de Aprendizagem Transformadora do Aluno. Os docentes utilizam o Moodle como seu Sistema de Gerenciamento de Aprendizagem (LMS) em sua universidade.
Durante a apresentação, Dervan falou um pouco sobre a implementação na Technological University Dublin, os eventos que foram realizados e também das atividades relacionadas à aprendizagem transformadora. “Mais professores estão aproveitando a oportunidade de dar aos alunos a aprendizagem transformadora”.
Para ter um feedback sobre o programa de STLR, os estudantes foram questionados sobre o que acharam do conhecimento adquirido no processo. Networking, soft skills e empregabilidade foram alguns pontos destacados pelos discentes. “Me deu uma injeção de confiança”, dizia uma das respostas. Essa perspectiva não foi diferente do ponto de vista do docente. “Deu a eles mais confiança em interagir com as pessoas e reforçarem suas habilidades”. Além disso, os professores também destacaram uma melhora no desenvolvimento e competência dos alunos.
Sandra conta que os professores apontaram que, após a implementação do programa STLR, os alunos estão mais ligados, fazem mais anotações e refletem mais sobre o evento. "Muitos alunos, quando entram na Universidade, não querem fazer perguntas ao professores, parar e refletir. Mas, depois, eles interagem, trabalham em equipe. É um crescimento muito grande do primeiro ao quarto ano. Os alunos já estão se transformando e é importante que eles reconheçam isso”, acrescenta.
Ao final do webinar, os docentes agradeceram a oportunidade de participar do debate e de conversar com centenas de profissionais do Mackenzie e reforçaram como o diálogo e a colaboração são essenciais em momentos como este, de enfrentamento à pandemia.