Cultura

Transformações sociais da Reforma Protestante

Evento no Mackenzie relembra história e faz paralelo com cenário atual

31.10.201817h43 Comunicação - Marketing Mackenzie

Share on social networks

“A Reforma Protestante foi um movimento espiritual que afetou outras áreas da sociedade. Ela teve início com um homem indignado e revoltado, Martinho Lutero, que conhecia as escrituras, era um estudioso que teve um olhar crítico sobre o que se pregava e teve coragem de se opor a algumas questões polêmicas do seu tempo, como o comércio de pecados e de perdão que a Igreja realizava. Seus impactos podem ser vistos até hoje na sociedade do século XXI, com benefícios políticos, econômicos e éticos”.

No dia em que se comemora o aniversário da Reforma Protestante, relembrando a publicação das 95 teses de Lutero, em 31 de outubro de 1517, a fala de Roberto Brasileiro, presidente do Supremo Concílio da Igreja Presbiteriana do Brasil (IPB), resgata as transformações que a Reforma trouxe para a época e que ainda reverberam na sociedade atual. Brasileiro se apresentou na Universidade Presbiteriana Mackenzie, em Higienópolis, na noite de 30 de outubro durante o I Colóquio sobre “A Reforma Protestante e o seu impacto no século XXI”, que contou com abertura do Coral Universitário do Mackenzie, regido pelo maestro Parcival Módolo.

A abertura do Colóquio contou também com a presença do reitor da UPM, Benedito Guimarães Aguiar Neto; Davi Charles Gomes, chanceler do Mackenzie; Marcel Mendes, diretor do Centro de Educação, Filosofia e Teologia (CEFT); Marcelo Martins Bueno, coordenador do Programa de Pós-Graduação em Educação, Arte e História da Cultura; Ricardo Bitun, coordenador do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião; Marili Moreira da Silva Vieira, pró-reitora de Graduação e Assuntos Acadêmicos; e Jorge Alexandre Onoda Pessanha, pró-reitor de Extensão e Educação Continuada.

Impactos históricos – Estado e Igreja

De acordo com Brasileiro, Lutero escreveu as 95 teses como um convite ao papa da época para conversar e dialogar sobre o que estava acontecendo com a Igreja, mas o papa se revoltou e chegou até mesmo a chamar Lutero de “javali” por uma questão econômica. “A Igreja estava endividada e precisava de dinheiro, não querendo abrir mão do poder que tinha sobre o Estado e sobre o comércio de perdão. O endividamento é um assunto sério desde o século XVI”, enfatiza o presidente da IPB.

Ele lembra que este racha na Igreja foi muito importante e que os reformadores tiveram proteção de várias cidades e Estados, pois a Igreja costumava se utilizar do artifício da excomunhão para fazer com que os governos se dobrassem à sua visão. “Lutero questiona esses pontos, concedendo maior liberdade aos Estados. Posteriormente, Calvino, declararia que a Igreja deveria ser a voz profética do Estado. Ou seja, a Reforma traz novamente a ideia de um governo representativo e revive a democracia”, pontua Brasileiro.

Esse movimento que hoje parece natural teve várias consequências, permitindo que a Igreja pudesse de ser independente do Estado e vice-versa. “Assim, a Igreja tem obrigações com o Estado e o Estado tem obrigações com todo o povo”, assinala. O presidente do Supremo Concílio admite que a voz profética da Igreja nem sempre foi ou é utilizada da maneira como deveria, sendo muitas vezes silente em momentos nos quais deveria se pronunciar, como ocorreu durante a Segunda Guerra Mundial, por exemplo. “Esse é um ponto de amarra, porque a Igreja só pode se manifestar em questões do Estado se for demandada a falar, o que pouco ocorre”, lamenta.

Atualmente, a preocupação do reverendo da IPB é que a Igreja deva ser uma luz para o Estado. “Não podemos deixar que um se utilize do outro, mas sim que trabalhem juntos em prol do povo. O Brasil tem essa divisão bem estabelecida e isso é bom”.

Economia e educação

Na visão econômica, a Reforma produziu pessoas diferentes, modificando o conceito de vocação e o ampliando para qualquer outra área além da vida sacerdotal. Calvino expandiu essa ideia e não aceitou a "imobilidade" das pessoas, permitindo esse trânsito por classes que era tão restrito antes, ou seja, ele já trazia em sua tese o conceito de liberdade econômica, livre trânsito e livre pensamento.

“Calvino dizia que se deve gastar sempre menos, economizar e utilizar o dinheiro para ajudar os outros sem condições. Sobre esta tese se fundam escolas públicas e grandes universidades, na Europa e nos EUA. É também sobre este conceito que o Mackenzie existe”, relembra Brasileiro, complementando que “não pregamos um capitalismo selvagem, mas sim um capitalismo de desenvolvimento”.

Todas essas questões, estão atreladas à liberdade de expressão que é a partir de onde tem início a máxima da Reforma, o livre exame e reflexão das escrituras, em vez de centralizar isso na Igreja. “Até então, a Igreja era mais importante que a Bíblia, e a transformação principal ocorre aí”.

Liberdade

Segundo conta o presidente da IPB, os presbiterianos creem na liberdade, e esse é o diferencial que afeta toda a sociedade, pois é missão conscientizar a população do seu papel, mas não restringir a visão de seus fiéis. Em um paralelo com a sociedade atual, ele cita que é necessário haver liberdade para se combater a corrupção e a inversão de valores vivida pelo Brasil. “Entretanto, é necessário cuidado com o tema e avaliar se nossa liberdade não está ferindo ou humilhando os outros. A liberdade tem de ser responsável e consciente”, complementa.

Ética

O último impacto da Reforma foi na ética que, segundo a visão de Brasileiro, parece desgastada hoje em dia, como comenta o reverendo, “fora de Cristo, tudo está fora do mundo”.

Ele diz que se não fosse a ética calvinista ter entrado em voga, a Reforma não teria alcançado a força e proporção que tomou. E destaca que foram as mais de quatro mil cartas de Calvino que influenciaram as pessoas, bem como sua atuação na Academia de Genebra.

Quanto ao cenário atual, Brasileiro lamenta que nossa ética esteja em frangalhos e seja uma colcha de retalhos, com um relativismo tomando conta das coisas. “A ética reformada valoriza cada ser humano como justificado pela fé e criado a imagem e semelhança de Deus, colocando o respeito como pilar, seja em tempos de calmaria, seja em momentos turbulentos”, finaliza.