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O que poderia ter evitado a tragédia no Litoral Norte de São Paulo?

Conversamos com o professor Paulo Afonso Luz, da Escola de Engenharia da UPM, sobre os deslizamentos ocorridos em Ubatuba, São Sebastião e outras cidades

01.03.202311h47 Comunicação - Marketing Mackenzie

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São Sebastião, Ilhabela, Ubatuba e Caraguatatuba, no Litoral Norte de São Paulo, sempre foram conhecidas por suas belas praias e por sua natureza exuberante. Mas desde os dias 18 e 19 de fevereiro, a região foi assolada por chuvas recordes e enfrenta uma tragédia que matou mais de 60 pessoas e deixou 1.090 pessoas desalojadas e 1.172 desabrigadas. De acordo com o professor da Escola de Engenharia (EE), Paulo Luz, a situação poderia ter sido bem diferente se diversas ações tivessem sido tomadas pelo poder público.

O professor explica que alguns fatores contribuíram para o alto nível de vítimas na tragédia. Primeiro, o alto índice de chuva no dia da tragédia: choveu um total de 630 mm em 24 horas, em uma região topográfica - a Serra do Mar - em que os deslizamentos de terra são corriqueiros. Segundo, e mais preocupante, é o adensamento populacional em áreas de risco, sem que as diversas instâncias de governo fizessem qualquer ação para retirar as pessoas dessa situação.

“As pessoas que moram nesses locais não são as culpadas pelas tragédias – elas residem em um local onde podem pagar por essa moradia, quase que sempre em loteamentos irregulares, sem quaisquer registros formais", aponta o professor. 

O docente detalha que o adensamento populacional em áreas de risco provoca uma série de consequências: piora o escoamento de água superficial, altera a geometria das encostas, aumenta o nível de infiltração da água de chuva (o que acarreta a elevação do nível de água do lençol freático e diminui a resistência dos solos das encostas), elimina as áreas com cobertura vegetal (mesmo que seja vegetação rasteira – grama) e coloca sobrecargas (mais peso) das próprias casas sobre as encostas.

Além do alto índice pluviométrico na região, o local dos acidentes possui um tipo de formação geológica mais suscetível à ocorrência de escorregamentos. Aliado a um período em que as chuvas são mais intensas, os deslizamentos se tornam mais recorrentes.

Esse cenário proporcionou a intensificação da tragédia e, na avaliação do professor, a responsabilidade deve ser dividida entre as esferas municipal, estadual e federal. 

Todavia, a grande maioria das prefeituras não possui recursos suficientes para implantação de uma política de prevenção à ocorrência de escorregamentos de encostas. “Somente as prefeituras mais ricas e também as cidades que já possuem um histórico de problemas relacionados a deslizamentos”, diz o docente, lembrando que o litoral norte não possuía nenhum tipo de sistema de sirenes de alerta, como acontece em outras cidades que já possuem histórico desse problema.

O sistema de sirenes para escorregamentos possui um funcionamento e uma estrutura parecidos com o sistema de sirenes para cidades situadas próximas de barragens de rejeito de mineradoras. Existe um responsável por analisar todas as informações referentes à ocorrência de chuvas fortes que aciona a sirene; esta emite, além do seu som característico, um aviso sonoro (“Moradores: risco de escorregamento, abandonem suas casas e se dirijam a um abrigo”). Desta forma, os moradores, que já devem ter participado de vários treinamentos e simulações, tanto para o abandono das suas moradias, quanto para saber onde ficam os abrigos (geralmente escolas, quadras esportivas, galpões), podem se dirigir a eles e conseguem sair a tempo de suas casas, ficar abrigados de forma temporária, evitando a ocorrência de mais vítimas fatais.

“Não adianta apenas lamentar e tomar apenas ações emergenciais a cada acidente provocado por escorregamentos de encostas em áreas de risco – é preciso que o Poder Público, nas três esferas de atuação, elabore políticas de planejamento de uso do solo adequadas, que sejam postas em prática, para que as tragédias deixem de ser anunciadas e não aconteçam mais”, conclui o professor.