Dia mundial da liberdade de imprensa e os rumos do Brasil
No dia 03 de maio é celebrado o dia internacional da liberdade de imprensa. A data foi convencionada na Assembleia Geral da Nações Unidas, de 1993 como forma de celebrar “os princípios fundamentais da liberdade de imprensa, para avaliá-la em todo o mundo, para defender a mídia de ataques contra a sua independência, e para prestar tributo aos jornalistas que perderam a vida no exercício de sua profissão”( https://en.unesco.org/commemorations/worldpressfreedomday, 02.mai.2019).
A liberdade de expressão é a consolidação de um dos direitos mais intrínsecos ao ser humano, que a é liberdade da manifestação do pensamento. A criação de um texto, de uma pintura ou de uma música eternizam a existência humana e são indicativos da organização social daquele momento, naquele tempo.
A imprensa, uma das manifestações da expressão humana, ganha status de Quarto Poder (CARLYLE,1840), quando se convalida como o que se convencionou chamar de “cão de guarda” da democracia (ALBUQUERQUE, 2009).
A imprensa não é para agradar, mas sim, para incomodar. Seu papel como fiscal do exercício dos membros dos três poderes que constituem a república democrática brasileira (artigo 2º da Constituição Federal) dá aos cidadãos a oportunidade de conhecer o trabalho dos seus representantes (como os são os membros do legislativo e do executivo) e dos membros da magistratura que, usando do munus público, também devem atuar em prol dos cidadãos.
Assim é que garantir a liberdade de imprensa, além de caracterizar um direito humano (artigo 19 da Declaração Universal dos Direitos Humanos), deve ser também um exercício de cidadania.
A manifestação da maior ou menor liberdade de imprensa leva em consideração alguns fatores como (i) garantia constitucional da liberdade de comunicação (que tem uma abrangência além da liberdade de imprensa); a garantia do contraditório e ampla defesa nos casos em que são levados à juízo; tratamento dado à imprensa (dentro o qual se inclui a segurança dos jornalistas); descriminalização da conduta do jornalista (exceto se incurso nas previsões legais de calúnia, injúria e difamação), entre outros fatores.
Nesse tocante, destacam-se duas garantias à liberdade de imprensa, que são a proteção aos jornalistas e a judicialização de matérias jornalísticas com o fim de calar.
A organização francesa “Repórteres sem fronteiras” faz o monitoramento, em diversos países, da situação da liberdade de informação no mundo e os ataques dirigidos contra ela. De acordo com a organização, o Brasil ocupa a 105ª posição entre 180 países. A violência contra jornalistas é considerada crítica:
Em 2018 ao menos quatro jornalistas foram assassinados no país em decorrência da sua atividade. Na maioria dos casos, esses repórteres, locutores de rádio, blogueiros e outros comunicadores mortos cobriam e investigavam tópicos relacionados à corrupção, políticas públicas ou crime organizado, particularmente em cidades de pequeno e médio porte em todo o país (...) (https://rsf.org/pt/brasil, 02.mai.2019)
O Ctrl+x, por outro lado, é organizado pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo e conta com a ajuda de empresas de mídia e tecnologia que costumam ser alvos de processos de supressão de informações.
O portal Ctrl+x possui um ranking que indica as ações judiciais propostas contra jornalistas e/ou veículos de comunicação, especificando os locais da federação onde são propostas as ações, quais os partidos políticos ou o político que usa do instrumento judicial como forma de calar.
A organização indica em sua página que, durante o período das eleições, os políticos brasileiros já acionaram a Justiça pelo menos 340 vezes para tentar ocultar informações da internet. Em 52% desses casos, os juízes aceitaram os argumentos e determinaram que as informações fossem retiradas do ar. (http://www.ctrlx.org.br/noticia/politicos-ja-foram-340-vezes-a-justica-em-2018-para-esconder-informacoes-da-internet, 02.mai.2019).
A censura prévia é também um monstro que assombra os informativos durante o período eleitoral.
A realidade indica que não apenas o executivo e o legislativo podem usar a ferramenta do “cala a boca”.
O judiciário, até mesmo na mais alta corte, pode servir-se da justiça para perpetrar a censura, a pretexto da veiculação de “notícia falsa”.
Em todos os casos, ainda é melhor correr o risco da notícia falsa do que o risco de notícia nenhuma. Assim é o que dispõe a Constituição Federal (artigo 5º, IX e caput do artigo 220). Assim julgou o Supremo Tribunal Federal tantas vezes (Adpf 130, Adi 4815, Adi 2404, para citar algumas).
A solução para tratar as notícias falsas ou ainda a injúria, a calúnia e a difamação também estão contidas na Constituição Federal, quando ela diz que é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem (artigo 5º, V).
Ou nas palavras do Ministro Ayres Britto, em seu voto de relator da ADPF 130:
0 que se tem como expressão da realidade, portanto, é, de uma banda, um corpo social progressivamente esclarecido por uma imprensa livre e, ela mesma, plural (....). Corpo social também progressivamente robustecido nos seus padrões de exigência enquanto destinatário e consequentemente parte das relações de imprensa. De outra banda, uma imprensa que faz de sua liberdade de atuação um necessário compromisso com a responsabilidade quanto à completude e fidedignidade das informações comunicadas ao público. Do que decorre a permanente conciliação entre liberdade e responsabilidade, até porque, sob o prisma do conjunto da sociedade, quanto mais se afirma a igualdade como característica central de um povo, mais a liberdade ganha o tônus de responsabilidade. É que os iguais dispõem de reais condições de reagir altivamente às injustiças, desafios e provocações do cotidiano, de modo a refrear os excessos ou abusos, partam de onde partirem, venham de quem vierem (páginas 33 e 34 do voto).
Portanto, como já defendemos outras vezes, não há democracia sem liberdades, especialmente a liberdade de expressão, mãe de todas as que dela decorrem (artística, cultural, religiosa, profissional, de cátedra...).
O protagonismo é do cidadão. O cidadão que lê, que se torna crítico, que escolhe os parlamentares que o representam. E eis aí um dos maiores exercícios da democracia: o voto livre, direto e secreto. O exercício democrático, é um exercício de longo prazo de aprendizagem e com custos relevantes para sociedade, mas ainda assim, é o melhor exercício, pois é feito com respeito e com liberdade.
Bibliografia
ALBUQUERQUE, Afonso. As três faces do Quarto Poder. Trabalho apresentado ao Grupo de Trabalho “Comunicação e Política”, do XVIII Encontro da Compós, na PUC-MG, Belo Horizonte, MG, em junho de 2009. Disponível em: www.academia.edu/25956715/As_Tr%C3%AAs_Faces_Do_Quarto_PODER1, acesso em 04.out.2018.
CARLYLE, Thomas. On heroes, hero-worship, and the heroic in history. Disponível em: www.gutenberg.org/files/1091/1091-h/1091-h.htm, acesso em 02.mai.2019.
Ctrl+x, disponível em http://www.ctrlx.org.br/#/infografico, acesso em 02.mai.2019.