Como os profissionais de saúde podem converter a recusa familiar para doação de órgãos?

Paraná tem a menor taxa de recusa do país. Equipe do Hospital Mackenzie explica os segredos da abordagem correta

30.09.202409h01 Comunicação - Marketing Mackenzie

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Como os profissionais de saúde podem converter a recusa familiar para doação de órgãos?

Enfrentar os tabus é o grande desafio para ampliar as doações de órgãos no Brasil, pois a desinformação é a principal razão da alta taxa de recusa familiar, que chega a 45% no país, segundo a Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos (ABTO). O estado do Paraná tem o melhor índice nesse quesito com somente 25% das propostas recusadas, e profissionais do Hospital Universitário Evangélico Mackenzie (HUEM) explicam as estratégias para abordagens que encorajam as famílias a aceitar a doação.

Na instituição, que atua como centro transplantador e conta com um Banco de Multitecidos Humanos, a taxa de aceite é a mesma do Paraná, 75%. As entrevistas com os familiares de pacientes com morte encefálica são conduzidas pela Comissão Intra Hospitalar de Doação de Órgãos e Tecidos para Transplantes (CIHDOTT), composta por uma equipe multidisciplinar que tem objetivo de efetivar as doações de órgãos.

A enfermeira Hangela Pilon atua nessa função há quatro anos e relata os principais desafios e técnicas de abordagem para tratar deste tema delicado, em meio a um momento de dor e sofrimento enfrentado pelos familiares do paciente com morte encefálica.

“O primeiro ponto é a família entender que houve a morte encefálica, que não há como reverter, pois, neste momento existe muita negação e falsas esperanças de que o paciente pode se recuperar. Buscamos um equilíbrio entre o acolhimento dos sentimentos, respeito às fases do luto, mas precisamos de forma técnica demonstrar o não funcionamento do cérebro”, destaca.

Vencida essa etapa, quando os familiares já estão cientes de que o paciente não tem mais vida, é feita uma avaliação se a família já está pronta para dar sequência ao procedimento ou se desejam estar com o paciente para se despedir. “Não podemos pressionar, é necessário agir com calma, de forma humanizada e acolhedora”, diz Hangela.

Desmentir boatos

Durante a entrevista para solicitar a doação dos órgãos, segundo a enfermeira, é o momento para esclarecer os rumores e desfazer os diversos boatos que cercam o assunto, pois muitos deles é que resultam na negativa da família, Questões religiosas também estão entre as razões de recusa e para conversar a respeito da espiritualidade, o Hospital Mackenzie conta com uma equipe de capelania.

“Não é incomum ouvirmos que os hospitais não se esforçam para salvar a vida de doadores declarados, o que obviamente é uma informação falsa. O fato do paciente ser doador não altera em nada o atendimento prestado. Há também quem diga que para retirar os órgãos o corpo só é liberado cinco dias depois, outra inverdade, já que no máximo em 24 horas o corpo recebe a liberação”, salienta Hangela.

Outra informação falsa bastante difundida é que o corpo sofre deformações no processo e o velório precisa ser com o caixão fechado. Na verdade, a retirada dos órgãos acontece como uma cirurgia normal, o corte é suturado e fica imperceptível, podendo o corpo ser velado com o caixão aberto, inclusive no caso das córneas, pois uma prótese é colocada no lugar e as pálpebras são fechadas.

Além dos órgãos internos, a pele também pode ser doada e é fundamental para reconstituições especialmente em pacientes que sofrem grandes queimaduras. A doação de pele gera muitas dúvidas nos familiares, com pessoas imaginando cenários irreais de mutilação do corpo.

Atuando na CIHDOTT do Hospital Mackenzie há pouco mais de um mês, a também enfermeira Daniele da Costa explica o procedimento de doação de pele. “Através de raspagem é retirada somente a camada mais superficial da pele das pernas e das costas, fica praticamente imperceptível, a única mudança é um aspecto mais claro. Também não interfere no velório”, afirma.

Hangela conta que já entrevistou famílias que não queriam a doação porque os órgãos não seriam destinados para o primeiro da fila de transplantes. “Temos que explicar o funcionamento, pois realmente não vai para o primeiro da fila, a doação tem outros critérios como a gravidade do quadro do receptor e a proximidade entre o órgão doado e o paciente que vai recebê-lo”, esclarece.

Conversar em vida

Essencial conversar sobre o assunto com os familiares, deixar claro em vida que deseja realizar a doação de órgãos, pois segundo as enfermeiras do Hospital Mackenzie, quando a família tem ciência da vontade do paciente em doar, o índice de recusa praticamente inexiste. “Infelizmente as pessoas têm medo de falar sobre isso, pela crença de que atrai acontecimentos ruins. É preciso superar esse receio para ser responsável por salvar outras vidas”, salienta Daniele.

Hangela finaliza descrevendo a sensação de possibilitar uma doação, por meio da argumentação com os familiares. “É uma alegria muito grande conseguir uma conversão, sentimento de dever cumprido, saber que até dez vidas poderão ser salvas graças ao sim que a família deu”, ressalta.

Banco de Multitecidos

Além de ser um centro transplantador, realizando transplantes de fígado, rim e córneas, o Hospital Evangélico Mackenzie possui o único Banco de Multitecidos Humanos do Brasil, onde capta, processa e armazena válvulas cardíacas, pele, córneas, tecido ósseo e musculoesquelético.