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Dopamina, vícios e saúde mental: Anna Lembke palestra no Mackenzie

Psiquiatra foi convidada do Fronteiras do Pensamento

17.09.202417h15 Comunicação - Marketing Mackenzie

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A Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM) sediou, nessa segunda-feira, 16 de setembro, mais uma edição do Fronteiras de Pensamento. A palestra dessa edição foi com a psiquiatra Anna Lembke. O evento foi realizado no auditório Ruy Barbosa, campus Higienópolis.
 
O Fronteiras do Pensamento é um evento realizado desde 2006 e que reúne pensadores, pesquisadores e professores que debatem sobre temas atuais e urgentes na sociedade. A palestrante do evento realizado na UPM é psiquiatra e professora  da School of Medicine, de Stanford, nos Estados Unidos. Além disso, é autora do livro best-seller, Nação Dopamina e, também, do livro, Nação Tarja Preta.
 
A palestra foi dividida em três momentos: primeiro, Lembke explicou o funcionamento da dopamina no cérebro e a maneira como a neurociência explica os vícios humanos; em seguida ela discutiu o Paradoxo da Abundância, um termo cunhado por ela e que ajudaria a explicar as crises de saúde mental existente na sociedade moderna; por fim, a professora evidenciou um caminho para possíveis curas de vícios. 
 
A pesquisadora partiu da premissa de que o ser humano faz de tudo para fugir da dor, mesmo que isso implique em adotar comportamentos que considera reprováveis ou que comprometa algum de seus valores morais. Para isso, explicou como funciona a neurociência cerebral. 
 
A seguir, Lembke mostrou como o cérebro foi feito para atuar em um estado de equilíbrio, chamado de homeostase. Quando experimentamos algum momento de euforia ou alegria, ocorre a liberação de dopamina, neurotransmissor responsável pela sensação de prazer, recompensa e motivação humana.  
 
“Para regular a transmissão de dopamina, o cérebro passa por neuroadaptação, em busca de manter o equilíbrio. Depois do prazer, ocorre a “ressaca” ou a fissura, momento em que a balança tende para o que chamamos de dor”, explicou ela. 
 
Anna Lembke explicou que o vício atua justamente na desregulação desse equilíbrio: ao se consumir uma substância viciante, o pico extremo de dopamina gera um pico tão extremo quanto ou maior de dor e, ao em vez do cérebro alcançar a homeostase, ocorre um déficit, e a pessoa se mantém em um estado de dor. “A pessoa começa a usar a substância para não cair na dor, nem é mais para obter prazer”, apontou. 
 
“Quando acontece uma exposição repetida, o pico de dopamina é cada vez menor, mas o déficit de dopamina é maior, o que gera uma deficiência do neurotransmissor. É quando acontece o vício”, destacou Lembke. 
 
A psiquiatra também apontou que, na sociedade atual, as substâncias viciantes vão muito além de drogas e pornografia, elementos que são conhecidos como altamente estimulantes e capazes de provocar vícios destrutivos. Existem muitos comportamentos e objetos que podem, também, provocar vício, basta que se torne algo compulsivo. No mundo moderno, a tecnologia, por exemplo, é um dos maiores exemplos de “substância” viciante. 
 
“Vivemos em um mundo que esgota a produção endógena da dopamina, pois somos bombardeados por estímulos. Por isso, é difícil se livrar de vícios”, disse a professora. 
 
De acordo com a psiquiatra, o comportamento compulsivo, associado à liberação de dopamina, também evidencia uma quebra em paradigmas pessoais. “Quando estamos em busca de dopamina, fazemos coisas que estão fora da sintonia dos nossos valores morais”, apontou.
 
Após a explicação neurocientífica, Lembke abordou o que ela mesmo chama de Paradoxo da Abundância. Ela explicou que vivemos em um mundo de superabundância, que nos leva a imaginar que temos tudo o que precisamos, que temos todas as nossas necessidades básicas garantidas. Apesar disso, as pessoas estão cada vez menos felizes. Basicamente, transformamos atividades saudáveis em atividades prejudiciais, viciantes, que nos levam a déficits de dopamina. 
 
“Viver em mundo de abundância está mudando a configuração do nosso cérebro ao alterar a balança do prazer/dor. Já estamos entrando no mundo cada vez mais com déficits de dopamina”, afirmou. 
 
Por fim, a psiquiatra apontou o caminho para se vencer vícios. Segundo ela, a prevenção é fundamental. “Devemos prevenir nossos cérebros de substância viciantes, inclusive sobre o uso de celular”. 
 
Ela destacou diversos aspectos necessários para a superação, entre eles, o que a psiquiatra chama de Jejum de Dopamina, como uma forma de restabelecer a capacidade de ter prazer e lidar com a sua ausência, ou seja, ter o equilíbrio no cérebro. Por esse caminho, as vias de recompensa são resetadas, o que pode gerar um grande benefício para saúde mental.
 
Ela também apontou o que chama de Alvo do Vício: para evitar o comportamento do vício, deve-se conhecer os gatilhos (que podem gerar o comportamento compulsivo) e, por fim, substituir por comportamentos saudáveis.  
 
Outra necessidade é a busca por moderação, afinal, muitos comportamentos e substâncias não são necessariamente ruins, mas podem se tornar compulsivos pelo excesso de dopamina liberada. “É importante falar sobre moderação. Algumas drogas não vamos conseguir nos abster, como a tecnologia, por isso precisamos saber como utilizá-la de maneira responsável”, finalizou. 
 
Após a palestra, a psiquiatra participou de um momento de perguntas e respostas, que contou com a participação do psiquiatra e professor da USP, Christian Dunker.
 
O pró-reitor de Extensão e Cultura da UPM, Cleverson Pereira de Almeida, presente no evento, agradeceu à organização do Fronteiras do Pensamento pela escolha do Mackenzie como uma das sedes. “É uma iniciativa singular em nosso país, assume um traço de grande ousadia. Quero deixar o nosso reconhecimento e o nosso agradecimento por essa parceria”, disse ele.