O ano de 2019 começou com um aumento nas tarifas dos transportes públicos da capital paulistana. O preço das passagens de ônibus municipais subiu para R$4,30, bem como as tarifas de Metrô e CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos). Antes do reajuste, os bilhetes custavam R$4,00.
Segundo Valter Caldana, professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM), a elevação da tarifa somada a uma maior dificuldade do cidadão em acessar o sistema de transporte - sobretudo em ambientes de crise econômica e altas taxas de desemprego - o uso de modais alternativos poderá crescer, sobretudo os deslocamentos a pé. “Mas, neste caso, infelizmente, não por bons motivos”, completa.
Para Paulo Becaltchuck, professor da Escola de Engenharia (EE) da UPM e especialista em mobilidade urbana, a elevação do preço influencia na locomoção e no trânsito da cidade. Ele conta que “o índice de mobilidade urbana, referente ao número de viagens diárias que uma pessoa faz nos diversos modais, é diretamente proporcional à renda”. Logo, os deslocamentos que não são absolutamente necessários tendem a diminuir.
“Já os custos dos deslocamentos obrigatórios impactarão na cadeia produtiva, principalmente na vida dos mais necessitados. Por exemplo, uma faxineira diarista terá um custo maior de deslocamento. Será que ela conseguirá aumentar o valor da diária?”, analisa Becaltchuck.
O coordenador do Centro Mackenzie de Liberdade Econômica (CMLE), Vladimir Fernandes Maciel, enfatiza que deslocamentos indispensáveis não deixarão ocorrer, em especial os de longa distância. “Neste caso, significa um aumento do custo de vida. Suponha 22 dias úteis e a combinação diária de duas viagens de ônibus e duas viagens de metrô ou trem, a tarifa integrada passou de R$6,96 para R$7,48 - uma diferença de R$0,52. Logo, a pessoa gastará R$ 1,04 a mais por dia, R$ 22,88 a mais por mês e R$ 274,56 a mais por ano”, calcula ele. A depender da renda de cada pessoa, isso é muito.
Além da mudança da questão monetária, a paisagem urbanística também se altera. Um exemplo, como já citado, é a população passar a optar por modais diferentes dos utilizados habitualmente. Segundo o professor da FAU, qualquer alteração de uso da cidade modifica a paisagem urbana, composta por edifícios, ruas, praças, e também por pessoas.
“Por exemplo, quanto mais gente na rua, mais dinâmica é a paisagem. Quanto mais as pessoas estiverem andando a pé, de patins, patinete, bicicleta, bicicleta elétrica, mais ativa, colorida, segura e alegre fica a paisagem urbana e o usufruto da cidade”, explica Caldana.
Do ponto de vista do professor Becaltchuck, não haverá uma mudança de modal significativa, uma vez que “a maioria absoluta das pessoas que utiliza o transporte coletivo o faz porque moram muito distante do trabalho e outro modal não é uma opção”.
Questionado se o surgimento de novos modais influencia diretamente no Plano Diretor Estratégico (PDE) da cidade, o professor Caldana explica que na verdade é o oposto. “É o PDE que tem o condão de induzir determinados usos da cidade por parte dos cidadão. No caso do PDE de 2014, por exemplo, o incentivo ao uso de modais de transporte "doce" (de baixo impacto e fácil acesso, ou seja: a pé, patins, patinete, skate, bicicleta), assim como o adensamento residencial e o uso misto nas regiões centrais e consolidadas da cidade, favorecem uma maior ocupação das espaços de uso público e tornaram a cidade mais dinâmica, acolhedora e segura”, explica o arquiteto.
A troca por outros modais se dá de diferentes formas, dependendo também da região em que cada indivíduo reside, segundo o coordenador do CMLE. “Bicicletas e patinetes de aluguel são algumas das alternativas, cuja despesa total pode ser mais cara, pois a cobrança é feita por minuto utilizado, mas isso só seria relevante nas regiões da cidade onde se tem essa oferta e, justamente nessas regiões as pessoas têm maior renda”.
Ou seja, a troca para esses modais não se dá prioritariamente por questão do custo adicional do transporte público, mas por uma mudança de costume e de padrão de demanda por deslocamento. “Na periferia, que não conta com estes serviços, por exemplo, a substituição se dá por aumento de viagens a pé ou por bicicleta própria”, aponta.
Para Caldana, o aumento da tarifa do transporte público, historicamente, é uma política pouco transparente na cidade de São Paulo, sobretudo se for considerado o alto volume de subsídio que o sistema consome, além do que é arrecadado nas catracas. “Por isso, o aumento da tarifa é uma decisão tão política quanto técnica, pois se trata de definir qual o volume de subsídio que se pretende destinar ao sistema”, finaliza.