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Avaliação da Entrevista de Ciro Gomes ao Jornal Nacional

Barômetro da Liberdade Econômica
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Avaliação da Entrevista de Ciro Gomes ao Jornal Nacional

Em uma iniciativa da Rede Globo, os cinco candidatos mais bem posicionados nas pesquisas de intenção de votos foram entrevistados na bancada do Jornal Nacional, cuja audiência é a maior da televisão brasileira. Foram, portanto, convidados e sorteados previamente a fim de ordenar as entrevistas: Ciro Gomes, Jair Bolsonaro, Geraldo Alckmin, Marina Silva e Fernando Haddad. No projeto em voga que objetiva realizar uma análise de conteúdo das falas dos presidenciáveis, buscou-se, sempre, trazer à tona os temas atinentes à economia, especialmente no que tange à liberdade econômica.

13.09.2018

Rodrigo Augusto Prando e Paulo Rogério Scarano


CIRO GOMES

 

Na entrevista, com Renata Vasconcellos e William Bonner, houve preponderância da temática da corrupção, de seu combate e da Lava-Jato, bem como dos comentários de Ciro a respeito desse cenário. Um momento mais áspero entre os jornalistas e o candidato sobre a possível indicação de Carlos Lupi, que, segundo os jornalistas é réu em processo na Justiça, para uma posição em seu governo.

Depois, as questões foram encaminhadas para a tentativa/desejo de Ciro de unir as esquerdas nesta eleição.

 

Ao tratar o ex-presidente Lula que, segundo Ciro, fez um bom governo, o candidato tocou, superficialmente, num aspecto econômico, assim em suas palavras:

“ Todo mundo que está nos testemunhando, por mais raiva que tenha dele [Lula], sabe que cinco, seis, sete anos atrás, o Brasil estava com um poder de compra maior, o Brasil estava com condição de crédito muito maior, o Brasil estava com uma taxa de desemprego muito menor, e a população mais pobre, que é por quem eu trabalho mais devotadamente, sentiu na pele as consequências de um bom governo.

 

E, na sequência, afirma:

“Da Dilma para cá, tudo isso foi perdido. Mas isso não quer dizer que a gente deva rasgar a história nem comemorar o fato de ter o maior líder popular do país preso. Na minha opinião, pelo menos”.

 

Avançando, na entrevista, chega-se ao seu ponto fulcral, que é a proposta de Ciro de “tirar o nome do brasileiro endividado do SPC”. Vejamos.

 

Bonner, assim, questiona:

“Candidato, vamos então agora a um outro ponto, que é o do seu programa de governo, que também é importantíssimo, que é a questão do endividamento. Sem dúvida nenhuma, é uma questão gravíssima, é uma questão que aflige milhões de brasileiros, são mais de 60 milhões de famílias com esse problema. Só que, diante da gravidade do problema, o senhor veio a público e disse a seguinte frase: “Fique tranquilo, vou tirar o seu nome do SPC”. É uma frase muito simples. É tão simples que ela não traduz a complexidade daquilo que efetivamente o senhor está pretendendo fazer com os endividados brasileiros. O senhor quer fazer um refinanciamento dessas dívidas”.

 

E, ainda:

“Neste ponto, eu pergunto ao senhor: diante da simplicidade com que o senhor ofereceu aos brasileiros essa promessa “vou tirar o seu nome do SPC”, embora se trate de um refinanciamento de dívida, o que que o senhor diz pra esse eleitor, que enxerga nessa sua forma de encaminhar a proposta, uma tentativa de oferecer a ele uma troca de favores?”

 

E a resposta de Ciro, vai na seguinte direção:

“Bonner, eu fui o governador mais popular do Brasil. O prefeito de capital mais popular do Brasil. O ministro da Fazenda entrava nos restaurantes do Rio de Janeiro debaixo de palma. Não é porque eu fiz milagre, não, é porque eu honro a minha palavra. E as coisas são simples. A palavra que eu digo não é essa, e eu vou repetir aqui: eu vou ajudar a tirar o seu nome do SPC. Por quê? Porque eu estudei o assunto faz um ano, com especialistas. A dívida média de quatro mil pessoas... [sic] R$ 4 mil, com desconto que no leilão do Serasa já tá acontecendo, essa dívida cai pra R$ 1,2 mil. Se eu faço um refinanciamento tirando os juros de 500% que eles hoje são humilhados, para 10%, 12%, o banco ganha dinheiro e eu refinancio isso em 36 vezes. A prestação cai de R$ 40 por mês. Eu vou tirar o nome do povo brasileiro do SPC mesmo”.

 

Na resposta, Ciro se equivoca com o número de endividados, afirmando ser 4 mil o que, na verdade, significa que a dívida média dos endividados é de R$4.000,00. Para ele, Ciro, há um projeto – de sua candidatura, de projeto nacional e, por isso, afirma:

[...] é porque eu tenho um projeto nacional de desenvolvimento que propõe respostas práticas de como reativar a economia e gerar emprego. O primeiro grande motor na tradição brasileira, e não é o melhor, mas o primeiro grande motor de ativação da economia, um minuto só, é o consumo das famílias”.

 

E mais:

“Se você tem 63 milhões de pessoas humilhadas, com o nome sujo no SPC, como é que eu vou ativar o motor principal da atividade econômica [...]”

 

E Ciro afirma aos entrevistadores que estava de posse de um “manualzinho” que explicava como tal ação se daria:

“Está tudo aí, inclusive as garantias. Aval solidário, que a gente já tem muita experiência”.

 

Renata Vasconcellos, então, afirma:

“Então, como a gente viu, de fato é bem mais complexo do que um simples slogan, tanto é que precisa de um livreto”.

 

E Ciro responde:

“É muito simples. O Brasil, Renata, dispensou R$ 390 bilhões de rico, de barão, em Refis, que é o refinanciamento de dívida de rico, e ninguém diz nada. Para refinanciar uma fração mínima disso, com crédito, não estou botando um centavo de dinheiro público, é um escarcéu. E agora está todo mundo vendo que é óbvio que é possível e necessário fazer. E eu estudei isso para fazer”.

 

Questionado se teria a vontade de unir as esquerdas, Ciro afirma que:

“Nunca me apresentei assim, vai me desculpar. Eu sou candidato de um projeto nacional de desenvolvimento que está amadurecido com o que há de mais preparado, mais inteligente, melhor informado no Brasil e no mundo sobre o Brasil. Passei os últimos três anos consultando essas inteligências e esse projeto está bem ordenado. Ele quer reunir concretamente os interesses de quem produz com os interesses de quem trabalha, e elege como grande adversário do conjunto da sociedade brasileira a especulação financeira e o baronato do rentismo. Então, esse é o desenho. Tem uma proposta de retomar o consumo das famílias pela superação do endividamento, projeto Nome Limpo, tem um programa para restaurar o investimento do empresariado, que também está colapsado, através da descartelização do sistema financeiro, que opera hoje tudo combinado, cobrando as taxas de juros mais imorais, destruindo (...), 13 mil indústrias foram fechadas no Brasil, do desmonte do governo Dilma para cá. Duzentas e vinte mil lojas, dos últimos anos para cá, nos últimos três anos, foram fechadas. Isso nos traz a 13 milhões e 700 mil desempregados, 32 milhões de pessoas absolutamente entregues a viver de bico. Sessenta e três milhões humilhados pelo SPC. Consertar conta pública é outra grande, específica e detalhada tarefa que está no meu programa de governo”.

 

E, ainda, afirma que retomando o consumo, unindo os interesses de quem produz com quem quer trabalhar, combatendo a especulação e o rentismo, inicia-se:

“[...] uma retomada da industrialização, que o Brasil está destruindo. Então, esse conjunto de providências precisa unir os interesses práticos de quem produz”.

 

Na sequência, mostra-se contrário à reforma trabalhista em voga:

“Nós queremos uma reforma trabalhista nova, mas uma que respeite o trabalhador, que proteja o lado mais fraco dessa relação selvagem do capital de trabalho”.

 

A respeito das questões tributárias, Ciro afirma:

“Se você olhar, sou eu que estou propondo imposto para os mais ricos, sou eu que estou propondo descartelizar, ou seja, acabar com "combinemos" de juros dos bancos”.

 

E, prossegue afirmando que se deve:

“[...] redesenhar o entendimento fiscal brasileiro, ou seja, consertar as contas públicas, em troca de um redesenho do pacto federativo. Hoje os estados estão quebrados, os municípios estão quebrados”.

 

Em síntese, no campo da economia, a proposta do candidato Ciro Gomes foi, na entrevista, centrada na renegociação das dívidas dos brasileiros que estão inseridos no SPC. Tal ação poderia, segundo suas concepções, reaquecer o consumo das famílias, retomando a industrialização. Além disso, coloca-se contrário à reforma trabalhista que, em sua opinião, favorece mais o patrão e, por isso, é selvagem para o trabalhador. Suas críticas, em muitos momentos, recaem sobre os rentistas, sobre o capital financeiro, que por sua dinâmica, acabam por impedir um mais vigoroso desenvolvimento entre os que produzem e os que querem trabalhar. Temas como pacto federativo e reforma tributária foram, apenas, tratados panoramicamente, não permitindo um maior aprofundamento analítico.

Infelizmente, o tempo relativamente escasso da entrevista e a preocupação dos jornalistas em abordar diferentes temas, como união das esquerdas, segurança pública, infidelidade partidária, grau de compatibilidade com a candidata a vice, além de grande ênfase no problema da corrupção, impediram de tratar mais a fundo os graves problemas econômicos enfrentados pelo país. Ciro Gomes pode ser caracterizado como nacional desenvolvimentista, pois ele mesmo afirma ser o “candidato de um projeto nacional de desenvolvimento”, o que já revela sua perspectiva intervencionista para a economia.

O pouco que foi apresentado da proposta de renegociação das dívidas dos brasileiros soa preocupante, pois, do modo como foi colocado, aparenta implicar interferência do governo na negociação entre as partes privadas envolvidas: o cidadão endividado e a instituição financeira, ferindo contratos previamente estabelecidos. O argumento de que nos leilões do SERASA já é prática das instituições financeiras oferecerem elevados descontos na renegociação de dívidas não autoriza os governos determinarem que é assim que deve ser feito. Cabe às partes, em negociação chegarem aos termos do acordo e não ao governo impor tais termos, até porque cada caso possui as suas especificidades e o governante não dispõe de todas as informações necessárias para determinar uma solução justa. Além disso, tal intervenção pode ocasionar consequências não intencionais em rodadas futuras. Entre tais consequências, destacam-se a possibilidade de racionamento de crédito, spreads ainda mais elevados e incentivo a um comportamento oportunista por parte dos devedores, ampliando a inadimplência futura, na expectativa de novos “socorros” do governo, a exemplo do que já acontece com o REFIS, ampliando o risco moral na economia brasileira.

Adicionalmente, Ciro informa que proposta para limpar o nome dos brasileiros endividados está em um contexto de recuperação da economia pelo estímulo ao consumo, revelando sua inspiração keynesiana. Vale destacar que o excesso de estímulo ao consumo, durante o governo petista, contribuiu para a aceleração da inflação, que se tornou patente no final do primeiro mandato de Dilma e para o elevado grau de endividamento das famílias. Ciro não esclarece porque acredita que repetir o que já foi feito trará resultados diferentes desta vez.

Em relação à produção, Ciro declara ter um programa para restaurar o investimento do empresariado. No entanto, da forma como o tema foi tratado no Jornal Nacional, a solução do candidato seria a “descartelização do sistema financeiro, que opera hoje tudo combinado, cobrando as taxas de juros mais imorais”. Tudo é colocado como se o problema dos juros elevados não tivesse relação com a baixa taxa de poupança da economia brasileira, tendo a despoupança do governo importante papel para esse quadro. Ademais, se é verdade que os cinco maiores bancos detêm mais de 80% dos ativos bancários, não se pode esquecer que entre tais bancos encontram-se o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal. Ao afirmar que há combinação entre os grandes bancos, implicitamente Ciro inclui os bancos públicos no cartel. No entanto, o governo já tentou interferir no mercado para reduzir o spread, obrigando os bancos públicos a fazê-lo, aumentando sua inadimplência, sem resultados efetivos em relação aos juros. Criar uma narrativa em que o sistema financeiro é o vilão fácil da história em nada contribui para o entendimento sobre o funcionamento da economia e sobre os reais problemas que atingem o país. Fala-se genericamente em “redesenhar o entendimento fiscal brasileiro” sem explicar como serão consertadas as contas públicas e o pacto federativo. Ciro não explica quanto vai custar o Estado do tamanho que ele pretende e nem aponta como será redistribuída a conta.

Por fim, Ciro afirma que a “reforma trabalhista selvagem […] está destruindo a relação de trabalho no Brasil” e fala em “uma reforma trabalhista nova, mas uma que respeite o trabalhador. Que proteja o lado mais fraco”. Não se pode esquecer que a reforma foi legítima e passou pelo Congresso Nacional. Propor uma nova reforma em tão pouco tempo serve apenas para criar mais insegurança jurídica e desestimular contratações formais.

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